O nosso objetivo nesse artigo é fazer uma abordagem da noção filosófica de revolução cientifica em Thomas Kuhn. A obra a ser trabalhada será: “A Estrutura das Revoluções Científicas”, mais precisamente em dois capítulos: A Natureza e a Necessidade das Revoluções Científicas e As Revoluções como Mudanças de Concepção de Mundo. No primeiro vamos expor de que modo ocorrem as revoluções cientificas e depois num segundo momento apresentaremos estas revoluções como mudanças de concepção do mundo.
Palavras-chave: Kuhn. Paradigmas. Anomalias. Crise. Revolução Científica.
Na sua grande maioria os cientistas concebem uma idéia de ciência
que evolui se aperfeiçoa o antigo até chegar à verdade. Kuhn rejeita a idéia de
transformação linear em favor da idéia de "revolução científica".
A escolha desse termo se deve a analogia com as revoluções
políticas. Quando chega o momento de uma revolução política, observa-se que os
problemas em questão se esgotaram, para que haja a transformação é necessário
recorrer a meios externos à política, sendo eles a persuasão de massas e à
violência. Quando se esgotam os recursos internos, com a ajuda de argumentos
externos, é possível transformar o próprio paradigma. Quando ocasiona atritos
entre paradigmas cada cientista busca superar o paradigma do outro. Não havendo
uma base para demonstrar que nenhum paradigma é melhor que outro, assim não
podendo haver uma discussão.
Já que para Kuhn a revolução cientifica e nada mais nada
menos que uma passagem de paradigma para o outro, trabalharemos neste artigo
dois tópicos da obra de Kuhn, o primeiro trata-se da necessidade das Revoluções
Cientificas e depois veremos as Revoluções como mudança de concepção de mundo.
Tanto uma como outra mostra a necessidade de uma superação dos valores e dos
paradigmas para chegar a uma concepção real.
Thomas Kuhn apresenta a
Revolução Científica como um processo de transferência de um paradigma a outro,
onde ocorre, a partir de uma crise, uma nova concepção a respeito de um
determinado fenômeno. Como vimos, seu
pensamento é fundamentado no paradigma, que é um conjunto de regras, suposições
teóricas gerais, e técnicas para aplicação de leis; orienta e dirige a
atividade de grupos de cientistas que nele trabalham. “Paradigma é o que os
membros de uma comunidade cientifica compartilham e, reciprocamente, uma
comunidade cientifica consiste em homens que compartilham um paradigma.” (Kuhn,
2006, p. 30)
Dentro de uma comunidade científica que se depara
com as anomalias e por conseguinte com a crise do paradigma, existem divisões
entre os membros, de um lado um grupo que parte em defesa do novo paradigma e
do outro um grupo que se dispõe a defender o paradigma que estava em uso;
veremos como o autor se refere a este fato:[...] as revoluções cientificas
iniciam-se com um sentimento crescente, também seguidamente restrito a uma
pequena subdivisão da comunidade cientifica, de que o paradigma existente
deixou de funcionar adequadamente na exploração de um aspecto da natureza, cuja
exploração fora anteriormente dirigida pelo paradigma. Tanto no desenvolvimento
político como no cientifico, o sentimento de funcionamento defeituoso, que pode
levar a crise, é um pré-requisito para a revolução.[1]
Um fator importante a ser destacado no pensamento de
Thomas Kuhn, é o fato de ele conceber este processo de Revolução Científica
como um processo não cumulativo, isto é, ele defende que a revolução da ciência
se dá por um esquema de cisão e não de cumulação, onde uma idéia é substituída
por outra, completamente, e não de uma soma de teorias.
E nesta fase de crise, a pesquisa não pode ser
predeterminada por um paradigma, visto que, o paradigma é que está em questão
quanto a sua validade: “ela não é e não pode ser determinada simplesmente pelos
procedimentos de avaliação característicos da ciência normal, pois esses
dependem parcialmente de um paradigma determinado e esse paradigma, por sua
vez, está em questão”. (Kuhn, 2006, p. 127)
Para dar sustentabilidade a uma nova teoria, é
preciso não somente, uma nova descoberta, mas sim uma argumentação suficiente
por parte dos cientistas que a defende, de modo que o grupo que defende o
paradigma antigo se convença de que é preciso que ocorra uma mudança na forma
de olhar os fenômenos e assim aceitem o paradigma proposto.
E também, não necessitamos de entender essa nova
teoria como uma teoria que vai contra a teoria que passou, mas pode ser somente
uma descoberta de fatos até então desconhecidos: “uma nova teoria não precisa
entrar necessariamente em conflito com qualquer de suas predecessoras. Pode
tratar exclusivamente de fenômenos antes desconhecidos...” (Kuhn, 2006, p. 129).
Isto se dá pelo fato de a história contribuir
diretamente com o avanço da ciência, ou seja, a ciência se desenvolve na
história, e a partir da historia, e não cumulativo, mas considerando as
descobertas como pressupostos para pesquisa.
[...] Podemos ainda conceber
outras relações compatíveis entre teorias velhas e novas e cada uma dessas
podem ser exemplificada pelo processo histórico através do qual a ciência
desenvolveu-se. Se fosse assim, o desenvolvimento científico seria genuinamente
cumulativo, novos tipos de fenômenos simplesmente revelariam a ordem existente
em algum aspecto da natureza onde esta ainda não fora descoberta. Na evolução
da ciência, os novos conhecimentos substituiriam a ignorância, em vez de
substituir outros conhecimentos de tipo distinto e incompatível.
Kuhn afirma que a pesquisa normal é cumulativa e não
a ciência no todo, de modo que esta pesquisa deve seu sucesso a habilidade dos
cientistas para selecionar regularmente fenômenos que podem ser solucionados
através de técnicas conceituais e instrumentos semelhantes às já existentes.
E quanto as novas teorias, ele afirma que só podem
emergir a medida que as antecipações sobre a natureza e os instrumentos dos
cientistas demonstrarem estar equivocados. Esta nova teoria de vê ocupar o
lugar da anterior e não somar com a já existente:“[...] no processo de sua
assimilação, a nova teoria deve ocupar o lugar da anterior. Mesmo uma teoria
como a da conservação da energia (que atualmente parece ser uma superestrutura
lógica relacionada com a natureza apenas através de tórias independentes
estabelecidas), não se desenvolveu historicamente sem a destruição de um
paradigma”.
Outra questão importante em seu pensamento é o
destaque que ele dá aos conceitos, onde ele afirma que a mudança de conceitos é
necessário, crucial para dar impacto revolucionário as novas teorias, e
salienta também que a ciência progride por meio de sucessivas mudanças de
paradigmas onde a cada nova concepção aprendemos sobre o mundo, a população que
o habita e o comportamento desta população. Eles são fonte de métodos, áreas
problemáticas e padrões de solução aceitos por qualquer comunidade científica
madura, em qualquer época que considerarmos.
E para encerrar o autor faz questão de dizer que a
tradição cientifica normal que emerge de uma revolução científica é não somente
incompatível, mas muitas vezes verdadeiramente incomensurável com aquela que a
precedeu.
Thomas Kuhn observa que há uma alteração na visão do
mundo pelos cientístas, após uma nova descoberta - uma adoção de paradigma -,
ainda que o mundo, essencialmente, se mantenha o mesmo. Pois a tradição
científica determina a forma visual de ver as coisas, todas as vezes que
acontece uma revolução científica, é necessário se reeducar para ver a nova
forma.
O autor inicia este capítulo dizendo que quando muda
o paradigma, muda com ele o próprio, mundo, isto deve-se ao fato de que ao
mudar um paradigma, mudam-se com ele os instrumentos que orientam as pesquisas,
deste modo entende-se como se a comunidade cientifica fosse transportada para um novo planeta, onde objetos familiares
são vistos sob uma luz diferente, isto é sob uma nova concepção. “Quando mudam os paradigmas, muda
com eles o próprio mundo,... os cientistas adotam novos instrumentos e orientam
seu olhar em novas direções. [...] é como se a comunidade profissional tivesse
sido subitamente transportada para um novo planeta, onde objetos familiares são
vistos sob uma luz diferente e a eles se apregam objetos desconhecidos”.
Vemos claramente que a mudança de um paradigma leva
os cientistas a verem o mundo de maneira diferente, pelo fato de que adotam
novos instrumentos para pesquisa, e também por que as mesmas trilham um caminho
totalmente novo, com novos desafio e que certamente levará a outros objetivos,
por isso após uma revolução cientifica, os cientistas reagem a um mundo
diferente.
Para exemplificar, Thomas Kuhn conta a experiência
de um homem que passa a usar lentes inversoras para enxergar o mundo.
Inicialmente ele vê tudo de cabeça para baixo, e isto lhe é muito caro,
desagradável e lhe deixa desorientado. porém, num determinado estágio, quando
ele passa a aprender a lidar com o seu mundo, ele passa a ver os objetos
novamente como via antes. Nesta metafora, o homem passou por uma transformação
revolucionária da visão. Conforme ele coloca no texto, o homem somente enxerga
as coisas que a sua experiência visual conceitual prévia lhe ensinou a ver.
O autor também usa o seguinte exemplo para
esclarecer este fato: “o que eram patos no mundo do cientista, antes da
revolução, posteriormente são coelhos”. Isto quer dizer que quando se muda a concepção das
coisas no âmbito da ciência, a concepção que o cientista tem do meio ambiente
também deve ser reeducada, isto é deve aprender a ver de uma forma diferente
aquilo que já estava familiarizado. “Quando a tradição cientifica
normal muda, a percepção que o cientista tem de seu meio ambiente deve ser
reeducada – deve aprender a ver uma nova forma em algumas situações com as
quais já está familiarizado. Depois de fazê-lo, o mundo de suas pesquisas
parecerá, aqui e ali, incomensurável com o que habitava anteriormente”.
Deve-se compreender também, que essas mudanças de
concepções não são confirmadas diretamente pelos cientistas, isto é: “ ao olhar
alua, o convertido ao copernicismo não diz “ costumava ver um planeta, mas
agora velo um satélite”. Tal locução aplicaria afirmar que em um sentido
determinado o sistema de Ptolomeu fora correto. Em lugar disso, um convertido a
nova astronomia diz: “ antes eu acreditava que a lua fosse um planeta, mas
estava enganado”. (Kuhn, 2006, p. 148). Isto quer dizer que um cientista, com
um novo paradigma, vê de forma diferente o que via anteriormente. Fica claro
para nós que os critérios da revolução cientifica em seu pensamento consiste
justamente em apresentar uma transformação radical no modo de ver, de pesquisar
e de conceber o mundo que está a sua volta.
E o que a principio parece uma
pequena mudança de paradigma, pode o ser inicio de grandes descobertas, no
sentido de que a pesquisa abrange, e toma proporções maiores até mesmo do que
se esperava, e este é e deve ser o objetivo de todo pesquisador, primeiro
estabelecer critérios e depois buscar avançar ao máximo no que se busca
conhecer: “ a pequena mudança de paradigma forçada por Herchel provavelmente
ajudou a preparar astrônomos para a descoberta rápida de numerosos planetas e
asteróides após 1801. (Kuhn, 2006, p. 153).
Muitos são os exemplos que podem ilustrar de maneira
clara o que Kuhn quer dizer quando afirma que as revoluções são mudanças de
concepção de mundo, mas um exemplo muito usado para explicitar esta ideia é a
concepção copernicana da mudança do geontrismo para o eliocentrismo, ou seja,
toda uma visão sobre determinado assunto é substituída por outra e com ela vem
os critérios de pesquisas, assim como os instrumentos da pesquisa e forma com
que esta deve ser aplicada.
Isto explicita claramente como o que
Kuhn quer dizer ao falar de mudança de mundo, de meio ambiente, de universo.É válido lembrar que quando ocorre uma mudança de
paradigma, em que o paradigma anterior cai em descrédito, isto não quer dizer
que em algum momento ele não contribuiu com ciência, muito pelo contrário, é
dentro de um paradigma que surgem as anomalias que se tornam crise e que
proporcionam a revolução, ou seja, ele serve de degrau para se chegar a
certezas mais claras a respeito de um determinado assunto.
Mas, como exemplo da dinâmica
newtoniana também indica até mesmo o mais impressionante sucesso no passado não
garante que a crise possa ser postergada indefinidamente. As pesquisas atuais
que se desenvolvem em setores da filosofia, da psicologia da lingüística e
mesmo da arte, convergem todas para a mesma sugestão: o paradigma tradicional está
de algum modo equivocado, além disso, esta incapacidade para ajustar-se aos
dados torna-se cada vez mais aparente através do estudo histórico da ciência.
Na visão científica, se houvesse uma autoridade para
perguntar como sua visão foi alterada (novo paradigma) seria considerada fonte
de dados, quanto ao comportamento de sua visão, seria considerado fonte de
problemas.
A espécie de problemas da visão científica é a mesma
da visão de experiência psicológica. Nas ciências, as alterações perceptivas
acompanham as mudanças de paradigmas. Como no exemplo citado: depois de Copérnico, podemos afirmar que o que
pensávamos que era um planeta é na verdade um satélite (estamos nos referindo à
Lua). Antes de Copérnico, não se pensava assim. Novamente vemos uma mudança de
visão dado um novo paradigma. Enfim, após estas descobertas os cientistas passaram
a enxergar o espaço de outra maneira, de uma nova forma, tanto é que logo eles
descobriram uma série de novos planetas e asteróides, graças à este novo
paradigma.
Ao
final deste artigo, percebemos que não há uma diferença entre o primeiro
capitulo estudado com o segundo, no primeiro tentamos apresentar como Thomas
Kuhn entende o progresso da ciência, e ficou muito claro que para ele este
processo se dá por meio de saltos, mudanças radicais, e no segundo vemos que as
conseqüências dessa radicalidade da mudança é que o mundo, o ambiente também se
transforma. Com as palavras do autor vemos que o que era pato antes da
revolução científica após é coelho, o que era um planeta antes da revolução
científica, agora é satélite, portanto, há
uma alteração na visão do mundo pelos cientistas, após uma nova descoberta -
uma adoção de paradigma -, ainda que o mundo, essencialmente, se mantenha o
mesmo.
Parece-nos evidente, considerando os
exemplos do autor, que de fato, esta mudança de paradigma, que é causa da
revolução cientifica, dá ao pesquisador “novos olhos” para enxergar as coisas,
como também novas características para as coisas até então não descobertas,
isto quer dizer que todas as vezes que acontece uma revolução científica, é
necessário se reeducar para ver a nova forma. É o mesmo que buscar um lugar por
caminhos diferentes, ou ainda buscar um objetivo com métodos novos.
Para nós são muito relevantes suas considerações,
visto que na grande maioria das vezes entendemos a revolução científica como
algo relacionado somente com os dados da experiência, e o que Kuhn esclarece é
que para dar credibilidade à descoberta cientifica, é necessário antes uma
teoria que somada com uma argumentação resulta na revolução da ciência.
Desta forma, vale destacar, que mesmo
após revoluções científicas, não somos apresentados a dados estáveis e
individuais, e embora após estas revoluções os cientistas passem a trabalhar em
um novo mundo, conforme suas novas percepções, o mundo mesmo não mudou em nada. Ao invés de ser um
interprete, os cientistas que adotam novos paradigmas são como o homem da lente
inversora descrito no começo deste artigo.
Em toda a revolução científica se
interpreta observações e dados, mas todos pressupõem um paradigma que permite
que conheça os dados e instrumentos utilizados para estabelecê-los e relevantes
para sua interpretação.
KUHN, S. Thomas. A estrutura das revoluções
científicas. 9 ed. São Paulo: Perspectiva, 2007.
Kuhn, 2006, p. 12
Kuhn, 2006, p. 129
Kuhn, 2006, p. 131/132.
Kuhn, 2006, p. 147
Kuhn, 2006, p. 148
Kuhn, 2006, p. 158