Este capítulo narra a passagem das teorias da interpretação (que buscavam definir métodos interpretativos) para as teorias da argumentação (que buscam estabelecer padrões para a identificação de argumentos consistentes), que ocorreu na esteira da virada pragmática do giro lingüístico.
Jogo
Como não haviam definido as regras, a coisa não estava clara:
– Precisamos de definir as regras para saber quem ganhou, se eu, se o senhor... – disse o senhor Duchamp a Calvino, recolhidas que estavam já todas as peças e o jogo concluído.
– Mas agora, depois de termos jogado?
– Têm de existir regras... – insistiu o senhor Duchamp – para sabermos quem venceu.
– Mas agora quem define as regras? – questionou Calvino.
– Você ou... eu.
– Então... eu ou você?
– Você começa – propôs o senhor Duchamp –, depois eu termino.
– Não – ripostou Calvino. – Você começa; cada um formula alternadamente uma regra, e eu... defino a última.
– Aceito. Dez?
– Dez regras.
Começaram então, em alternância, a formular regras para o jogo que já haviam jogado, cada um tentando definir o jogo capaz de o fazer, embora a posteriori, vencedor.
Gonçalo Tavares, O Senhor Calvino