É interessante observar que a jurisprudência norte-americana sempre demonstrou a consciência de que nenhum direito é absoluto. Além disso, ela também demonstrou desde muito cedo a percepção de que há direitos constitucionais mais importantes que outros, de forma que as restrições a eles impostas pelo executivo ou legislativo necessitariam de uma justificativa mais forte que a usual. Essa intuição terminou por se consolidar na teoria do strict scrutiny - que será tratada de forma mais aprofundada no tópico sobre equal protection -, mas ao menos desde os anos 20 a Suprema Corte busca desenvolver métodos para tratar desses casos delicados.
Entre eles, um dos que levanta grandes discussões é o das limitações à liberdade de expressão. Durante a Primeira Guerra Mundial, foi editada a Lei de Espionagem, que previa punições a todos os que causassem obstáculos ao recrutamento e alistamento de soldados. Nessa época, Schenck e outros pacifistas distribuíram panfletos conclamando as pessoas a não se submeterem às convocações, afirmando que a conscrição violava a 13a Emenda e que apenas era de interesse dos poucos privilegiados de Wall Street. Não se estimulava nenhum ato de violência, mas apenas a resistência pacífica. Embora a Corte tenha admitido que essas afirmações seriam protegidas pelo Bill of Rights em condições normais, ela sustentou que uma tal restrição à liberdade de expressão seria aceitável em virtude das peculiaridades de um tempo de guerra.[1] Foi nessa decisão que Holmes fixou o critério do perigo real e iminente como exigência necessária para a limitação dos direitos fundamentais mais importantes, como a liberdade de expressão. Nas palavras de Holmes, "a questão em todo caso é se as palavras utilizadas foram usadas em circunstâncias tais e são de tal natureza a criar um perigo real e iminente [clear and present danger]."[2].
Embora o julgamento de Schenck tenha sido unânime, as aplicações do teste nem sempre foram aceitos sem ressalvas - como se era de esperar de um critério que envolve decisões valorativas tão delicadas. No mesmo ano, por exemplo, ao julgar um caso em que a Corte considerou que a distribuição de panfletos marxista consistia um clear and present danger[3], Justice Holmes, acompanhado por Justice Brandeis, dissentiu sob o seguinte argumento:
"Creio que devemos ser eternamente vigilantes contra as tentativas de avaliar a expressão de opiniões que odiamos e acreditamos que podem ser mortais, a menos que elas ameacem interferir imediatamente em objetivos lícitos e urgentes do direito de forma tão iminente que uma reação imediata seja necessária para salvar o país."[4]
Essa linha jurisprudencial terminou por dar origem à doutrina do status privilegiado - preferred status doctrine -, segundo a qual alguns direitos, devido a sua importância capital, merecem um tratamento diferenciado. Para utilizar a descrição de Spicer:
"O direito estadual de regulamentar um serviço público abrange o poder de impor todas as restrições que um legislativo tenha uma "base racional" para adotar, desde que seja respeitado o devido processo. Mas as liberdades de expressão e de imprensa, de assembléia e de credo religioso não podem ser limitadas com esses escassos argumentos. Elas são suscetíveis de restrição apenas para prevenir perigos graves e imediatos a interesses que o estado pode licitamente proteger."[5]