Em apenas seis casos o princípio foi invocado pelo min. Marco Aurélio como fundamento para o controle de razoabilidade de atos administrativos e, em três desses casos, o princípio não serviu como instrumento para a avaliação das opções discricionárias. Nesses casos, o Tribunal não procedeu a um controle de razoabilidade, mas a um controle formal de legalidade, o que torna indevida a utilização de argumentos fundados no princípio da razoabilidade.
Ministro |
Processo |
Assunto |
Marco Aurélio |
HC 75.331 (1997) |
Reconhecimento de suspeitos |
RE 192.568 (1996) |
Prorrogação de validade de concurso |
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RE 221.066 (1998) |
Importação de pneus usados |
No HC 75.331, a completa ausência de motivação do ato administrativo leva à nulidade do ato, sem ser necessário indagar sobre os motivos que levaram o agente público a praticá-lo. Nesse processo, a questão julgada foi meramente formal. A prova que deu margem à condenação de um certo réu não observou as formalidades estabelecidas pelo artigo 226 do Código de Processo Penal, que estabelece regras sobre reconhecimento de suspeitos. Argüiu-se, então, a nulidade da condenação por absoluta falta de observação dos procedimentos estabelecidos em lei. Não se trata, pois, da avaliação de uma escolha discricionária, mas de um simples controle de legalidade. Defendemos, assim, ter sido indevida essa referência ao princípio da razoabilidade.
Todavia, esse equívoco é bastante revelador. Consideramos que a utilização equívoca foi resultado da falta de uma clara diferenciação entre atividade vinculada e discricionária. O artigo 266 do Código de Processo Penal dá margem à apreciação discricionária da autoridade pública na medida em que condiciona a dispensa de uma formalidade à impossibilidade prática de sua realização. O Relator identificou muito bem que a discricionariedade envolvida nessa decisão - sobre se é possível ou não a realização da exigência legal - deve ser avaliada segundo critérios de razoabilidade.
No entanto, não atentou para o fato de que, no caso em análise, não se tratava de uma avaliação da escolha discricionária em si, mas de verificar se o ato havia rompido a vinculação aos critérios formais de legalidade. Essa decisão indica a grande importância de estabelecer claramente a distinção entre atividade vinculada e discricionária para que se possa definir com precisão os limites do controle de razoabilidade.
No RE 192.568, tratou-se de um caso de prorrogação de concurso no qual parecia claro ter havido um desvio de finalidade. No entanto, não se enfrentou expressamente esse problema e deu-se ao caso uma solução incoerente com a jurisprudência anterior do Supremo, em uma decisão tão inconsistente que não oferece bases sólidas para firmar um entendimento adequado sobre o princípio.
No RE 221.066, julgou-se que o Poder Executivo tinha competência para regular a importação de pneus usados, sendo desnecessária a manifestação do legislativo.
Em todos esses casos, o princípio foi utilizado apenas como uma remissão a uma idéia geral de razoabilidade, e não como um princípio dotado um conteúdo jurídico específico. Nos três casos, havia apenas uma questão de legalidade, e não de legitimidade - motivo pelo qual consideramos inadequada a argumentação com base no princípio da razoabilidade.